O cineasta, António Pedro Vasconcelos, na sua crónica, publicada em 9 de Julho de 2010, no jornal intitulada "A Recuperação Notável do Terreiro do Paço", começa por escrever assim:
"Se há uma área onde a acção política ainda pode ter relevância e onde a cultura tem um papel diferenciador, é na gestão autárquica. Hoje, os políticos têm uma margem de manobra limitada, pela delegação de poderes a Bruxelas, pelo peso obsceno dos interesses económicos sobre as opções políticas, pelo escrutínio cada vez mais demagógico dos media, pelo peso dos lobbies, pela falta de qualidade dos políticos da geração dos Jotas.
Quer se trate de pequenas câmaras ou de juntas de freguesia (e há exemplos notáveis, como Ferreira do Alentejo, Óbidos ou Ericeira), quer de grandes cidades, a seriedade, o empenho, o amor à cidade e, fundamentalmente, a cultura e o gosto são decisivos para preservar, transformar e fazer crescer as cidades de forma justa, harmoniosa e atraente.
(...)"
Ora, com efeito, já em 16 de Junho de 2007, no mesmo jornal, ele dedicara a Ferreira do Alentejo e, em particular, ao elogio do trabalho da autarquia, a que eu presidi, uma crónica completa, com o título (surpreendente, embaraçante, reconfortante) "Um Exemplo de Gestão Autárquica".
Isso resultou da surpresa que foi para ele conhecer Ferreira do Alentejo (porque foi lá filmar cenas de "Call Girl") e a admiração que lhe causou as realizações da autarquia municipal concretizadas nos últimos anos.
Nunca me cruzei com o prestigiado realizador e intelectual, mais do que seja, virtualmente, para ler algumas das suas crónicas e ver alguns dos seus filmes.
Não nos encontrámos, nunca falámos, não somos conhecidos nem amigos.
A apreciação dele deve ser, obviamente, a de uma pessoa exigente, evidentemente conhecedora de muito Mundo, e desinteressada de me agradar.
Para a (minha) pessoa (ainda que juiz em causa própria, cuidado!) essa apreciação espontânea, de um isento, é significativamente aprazível.
O actual Presidente da Câmara, Aníbal Costa, também há-de ter ficado na mesma...
Reproduzo a seguir a crónica referida:
António Pedro Vasconcelos
Publicação: 16 Junho 2007
Um exemplo de gestão autárquica
A prospecção de locais para o meu próximo filme, Call Girl, levou-me a Ferreira do Alentejo. O filme, que se propõe ser uma versão moderna de O Anjo Azul, uma das mais célebres variantes sobre o tema da mulher fatal, passa-se num quadro de corrupção autárquica, numa pequena cidade imaginária do Alentejo. Em vez de um velho professor primário, austero e moralista, um autarca de bons princípios; em vez de uma cantora de cabaret, uma prostituta de luxo.
Uma das boas coisas do cinema é que nos põe em contacto com sítios e pessoas que, de outro modo, nunca teríamos conhecido. Neste caso, levou-me ao Baixo Alentejo, e permitiu-me descobrir um modelo de gestão autárquica digno de ser assinalado.
Presidida pelo Dr. Aníbal Costa, Ferreira possui um Museu que merece ser visitado. Ao contrário de muitas cidades espanholas, francesas ou italianas, a maioria das nossas cidades não oferece qualquer atractivo além de eventuais igrejas ou castelos. Ferreira está, desde há 12 anos, dotada de um Museu que é um exemplo do que se pode fazer para atrair visitantes e, ao mesmo tempo, dar aos jovens da terra um conhecimento da região, das suas origens e tradições.
Sob o impulso do autarca António Pita Ameixa, uma equipa de arqueólogos iniciou escavações que atestam a presença de várias civilizações na região, antes e depois do domínio romano. Não cabe aqui a enumeração das peças que compõem o museu, onde a apresentação é um exemplo de como se pode educar e cativar ao mesmo tempo o visitante. Além disso, o museu tem uma divisão dedicada a Michel Giacometti, um corso que se dedicou, nos anos 60 e 70, a fazer por nós o trabalho de recolher o repertório das canções populares do nosso folclore. E, para minha surpresa, exibe um Retábulo maneirista do século XVI, salvo pela intervenção da Misericórdia e posteriormente restaurado pelo museu, que constitui uma peça notável da nossa pintura renascentista.
Uma das brilhantes ideias do museu é envolver as populações, através do apelo ao seu contributo para as exposições temporárias, com peças que possuam; a outra, a de criar um espaço onde todos os sentidos são solicitados: a vista, os ouvidos, o olfacto e o próprio gosto.
Se acrescentar que se come divinamente em Ferreira, estou a dar mais uma razão para fazer uma visita à região. Comi uma açorda de tomate com bacalhau e uma sericaia como deve ser (sem ameixa em calda) n’O Páteo, um restaurante que aconselho que se apressem a conhecer, antes que os talibãs do ASAE dêem cabo dele, como ameaçam fazer aos poucos sítios deste país onde ainda se come com respeito pela tradição.
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